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quarta-feira, 25 de julho de 2018

Final de semana em Hpa-An


Monge mirim em Hpa-An.

Hpa-An é a capital de Kayin State, estado que faz fronteira com a Tailândia. A cidade fica aproximadamente 270 km de distância de Yangon, porém a viagem entre as duas cidades leva em torno de 6/7 horas de ônibus. Nos arredores tem várias montanhas, cavernas, templos e pagodas (santuários budistas) para serem explorados.

Escadaria da montanha Zwe Kabin

Fomos na sexta-feira final da tarde em um ônibus “Express” (ônibus local, tipo uma viagem no tempo pra 30 anos atrás) e chegamos quase 1 hora da manhã. Na verdade, a saída estava marcada para às 18:30 no ticket, mas saímos de Yangon às 18:00 (eles avisam que devemos estar na rodoviária com 1 hora de antecedência). Fizemos uma parada longa para jantar e ir ao banheiro (aparentemente não é comum ter banheiro dentro do ônibus), porém não entramos em nenhuma outra cidade no caminho. O que na real nem faz sentido, uma vez que não existe uma rodovia propriamente dita, e sim um tipo de estrada vicinal (o que explica o tempo de viagem para uma distância tão curta).

Macacos nos telhados do mosteiro no topo da montanha Zwe Kabin e a vista durante trilha

No sábado fomos fazer a trilha pro topo da montanha Zwe Kabin (722 metros de altitude). Fica um pouco fora da cidade, então pegamos o “táxi” local, uma moto com um carrinho anexo pra até 6 pessoas (tuk-tuk) até a entrada da montanha. Estrangeiros precisam pagar 3 dólares (4.000 MMK) pra poder subir. A trilha é sensacional, no meio de muito verde, várias cachoeiras e nascentes. Mas a gente teve muito azar, 10 minutos na trilha e começou a chover extremamente forte. As escadas são irregulares e, de tempo em tempo, nascentes passam pelo meio dela deixando a pedra extremamente escorregadia. Por conta disso e da parada numa primeira parte coberta, demoramos 1 hora e 50 minutos pra terminar a subida (Nem preciso mencionar que chegamos ensopados no topo, né?!).

Vista de cima da pagoda, a gente ensopado no meio da neblina.

Fomos recebidos por uma família gigantesca de macacos pulando entre árvores e o telhado do mosteiro e um aviso: “pernoite não é permitida para estrangeiros”. Cogitamos dormir uma noite lá (lemos sobre a experiência em vários blogs), mas depois pensamos no trabalho em fazer check-in e check-out no hostel, levar as coisas pra cima e depois descer com elas, e desistimos. Ainda bem! Ao menos pudemos almoçar lá, tem um restaurante vegetariano com um preço bem acessível (arroz, legumes frios e refogados, sopa e chá deu 2.000 MMK por pessoa – pouco mais de 1 €). Também é possível comprar bebidas e snacks pro caminho de volta. Depois de repor a energia, subimos o final das escadas pra pagoda e ter acesso a vista sensacional (ironia).

Almoço no restaurante do mosteiro.

A gente ia descer pelo outro lado, aparentemente uma mistura de escadas e trilhas de terra, mas depois da chuva que pegamos pra subir, ficamos com medo de simplesmente atolar na descida! Caímos algumas vezes pra descer, mas levamos apenas 1 hora e 20 minutos pra chegar no ponto inicial. O mesmo taxista voltou pra buscar a gente (ele deixou o telefone dele com a gente), a viagem ida/volta custou 10.000 MMK (6,25 €). Já de volta, caminhamos pelo centro da cidade, rodeamos o lago Kan Thar Yar, tomamos um café numa padaria nas redondezas e voltamos pro hostel, exaustos. Não tem muita opção de bons restaurantes na cidade, mas tinha um razoável perto do hostel e acabamos jantando lá as duas noites. No dia seguinte, bateu um arrependimento duplo por ter feito a trilha no sábado: primeiro porque o dia estava lindamente ensolarado; segundo porque eu mal consegui ficar em pé! As pernas pareciam gelatinas e cada degrau fazia com que eu sentisse cada uma das fibras dos meus músculos doerem insanamente.

Pagoda Kyauk Ka Latt.

Saímos depois do café da manhã pra pegar um táxi (na verdade era um motorista informal) pra levar a gente primeiro pra uma das principais atrações de Hpa-An: a pagoda Kyauk Ka Latt. Fica no caminho pra montanha Zwe Kabin, logo, é possível combinar os dois em um único dia. Ficamos 1 hora por lá batendo fotos, subimos até a pagoda (um degrau por vez! :D), passamos pelo mosteiro e visitamos o templo budista Chan Thar Gyi.

Templo budista Chan Thar Gyi.

O motorista esperou a gente e de lá fomos direto pra caverna Kaw Ka Thaung. Nosso interesse na verdade era visitar o vilarejo próximo. Tem diversas outras cavernas na região, mas não é recomendável visitá-las no período de monções e preferimos não correr o risco. Se fosse o caso, seria necessário ficar mais um dia pra poder visitar todas.

                                    Budas infinitos dentro da caverna Kaw Ka Thaung.

O vilarejo foi uma surpresa bem agradável. Tinha um movimento enorme de nativos estacionando, pensamos até que estava tendo algum tipo de evento. Mas na verdade a vila é cheia de restaurantes sobre o lago e termina num tipo de piscina pública (que estava lotada)! Almoçamos por lá e esperamos a chuva passar pra poder voltar pro ponto inicial onde o táxi foi buscar a gente. O trajeto total (em torno de 4 horas entre dirigir e esperar) custou 20.000 MMK (12,50 €).

Piscina pública do vilarejo com vários nativos.

Na cidade andamos meio sem rumo, entramos nos templos, algumas lojinhas locais, nas pagodas Thit Hta Man Aung (na rua principal) e a Naung Taw Gyi, que tem uma vista fantástica pro rio Salween (Thanlyin River).

Rio Salween: vista da pagoda Naung Taw Gyi.

Depois de lá, fomos jantar, voltamos pro hostel pra tomar um banho e carregar o celular antes de pegar o ônibus noturno. Dessa vez era um dos VIP, que era pra ser dos melhores. Bom, e era. Fomos 45 minutos mais cedo com medo de acontecer o mesmo que na ida, mas dessa vez o ônibus veio 50 minutos atrasado. E na verdade não existe rodoviária, é um ponto de encontro! Como era tarde, não tinha ninguém na rua, estava chovendo torrencialmente e todos os pontos secos que tentamos nos esconder aparecia uma barata (Leia isso chorando. Obrigada). Logo, preferi ficar na chuva na incerteza se o ônibus realmente viria. O ônibus veio, tinha coberta, água, tv individual que nem em avião, mas de novo, não tinha o principal: banheiro! Fizemos a mesma parada que na ida, e dei trabalho porque precisei ir uma segunda vez (pediram no pedágio pra me deixar usar o banheiro deles). Dessa vez fomos parados na fronteira do estado e o policial especificamente foi direto nos assentos ocupados por estrangeiros (provavelmente deve ter sido previamente informado) pra checar nossos passaportes.

Vista do vilarejo saindo da caverna 

Se fosse o caso de estar mochilando pela Ásia, o melhor seria continuar até Myawaddy e de lá passar pela fronteira pra Tailândia. O ônibus Express local é muito barato, custou 4 dólares (Yangon > Hpa-An)! Eu não ando com a mesma paciência de antes pra cálculos, mas acredito que a viagem toda (ônibus ida/volta, hostel, alimentação, atrações e táxi) custou em torno de 50 € por pessoa.

Caminho entre caverna Kaw Ka Thaung e vilarejo.

Pra finalizar, gostaria de dizer que estou cansada de ouvir pessoas arrotando e escarrando na rua. Desculpem o desabafo nada a ver com o final de semana turístico e até o próximo passeio.

segunda-feira, 9 de julho de 2018

Myanmar: primeiras impressões.

Vendedor de flores em Yangon, Myanmar

Finalmente entreguei minha tese. Não, ainda não terminei o doutorado, mas a partir do momento em que entrego a tese impressa e documentação, a única coisa que preciso fazer é esperar autorização pra marcar a data de defesa (na faculdade de medicina da RWTH demora em torno de 6 meses). Apesar de não receber mais a bolsa, tenho a devida autorização do governo em permanecer no exterior até a defesa e também pra realizar meu estágio fora da Alemanha. E sim, logo que eu defender o doutorado, finalmente nos mudamos para o Brasil!
Todo mundo me pergunta, mas por que Myanmar?! Não faço ideia. Na real, eu nem sabia onde o país ficava no mapa quando o Tim falou que foi aceito para um estágio aqui. Pra deixar a história curta, logo após aprovação do estágio dele, também enviei alguns currículos e no fim ambos fomos aprovados como estagiários (voluntários) na ONU Myanmar, em Yangon. O Tim está no departamento de drogas e crime (UNODC) e eu vim para a saúde do migrante (IOM/UM Migration).

Bike-táxi.

Já faz 3 semanas que estamos aqui, e finalmente resolvi escrever sobre nossas primeiras impressões. Chegamos em Yangon em plena estação de chuva: basicamente fomos recebidos com chuva e ainda não parou de chover. Fomos recebidos diretamente pela dona do apartamento que alugamos ainda da Holanda. Ela nos buscou no aeroporto, nos levou pra comprar chip pro celular, pra jantar, ao mercado e, finalmente, pro apartamento. Isso já mostra um pouco a personalidade das pessoas locais, só falta pegar na sua mão pra tentar te ajudar com o que for necessário.

Chuva em Yangon (essa tá fraquinha).
O apartamento é simples, mas exatamente como vimos nas fotos. Tivemos muita sorte porque aparentemente muitos estagiários internacionais vem para Yangon apenas com hotel e tenta alugar apartamento ao chegar aqui. Porém, dificilmente consegue-se fugir dos preços já vistos em Airbnb (que são exorbitantes para o padrão do país) ou ainda alugar temporariamente um lugar por menos de 6 meses (a gente fica 4 meses, no caso). Locais não falam inglês, e apartamentos “próprios para estrangeiros” seguem um outro padrão completamente diferente do padrão local, o que deixa o custo bem mais elevado. O que a gente conseguiu é bem meio termo, moramos num condomínio de prédios com portaria e segurança, mas numa área fora do centro onde há maior concentração de estrangeiros.
Como chegamos no domingo com jetlag e começamos a trabalhar diretamente na segunda-feira, na primeira semana só conseguimos prestar atenção na chuva, em como já se sai suando do banho devido ao calor, no trânsito caótico, na chuva,  na falta de calçadas na rua, em como o taxista não é capaz de ler o endereço no google maps, na chuva, e na comida, que, na minha opinião, foi único ponto positivo dos primeiros dias.

Comida de rua em Yangon, Myanmar.

No primeiro final de semana, tentamos sair pra conhecer o centro e foi um desastre. Choveu torrencialmente o final de semana inteiro. Única coisa que conseguimos fazer foi entrar no primeiro shopping e passar o dia lá, infelizmente. No domingo fizemos o passeio de trem em Yangon, mas depois escrevo mais especificamente sobre o passeio com fotos que tiramos do trajeto.

Mercadinho com frutas.

Alguns fatos básicos:
- Não usamos sapatos no local de trabalho: antes de vir estava preocupada comprando algumas roupas mais sociais pra trabalhar e eis que, quando chego, precisei diretamente tirar os sapatos pra entrar no prédio. Hoje estou completamente habituada a usar havaianas diariamente. Não é assim em todos os lugares, o Tim mesmo trabalha de sapatos. Mas definitivamente chinelo é tipo um sapato oficial na rua.
- Eles são extremamente conservadores. Uma vez vim de calça social e blusinha cavada com renda. Look completamente ok, eu juro! Sem decote. Minhas colegas locais me chamaram pra ir comprar roupas pós expediente e fui junto, numa promoção que elas queriam aproveitar. Como não tinha provador, tirei a calça pra experimentar as saias, mas a blusa colocava por cima da minha blusinha mesmo. Na hora de ir embora uma delas deu um grito que tinha esquecido de colocar minha blusa! Hahaha. Foi o dia que percebi que provavelmente não estou usando roupas adequadas pra trabalhar! :D
- É comum ver homens usando saias (longyi) e mulheres com roupas típicas e thanaka no rosto, parece argila, mas é uma pasta de uma árvore local que aparentemente protege a pele do sol e dá uma sensação de frescor. Ainda não testei!
- Não tem calçada. A gente divide a rua com os carros, ônibus, bicicletas e vendedores ambulantes. O tempo todo você leva buzinada e precisa grudar nos carros estacionados enquanto pula poças de água da última chuva nos buracos.
- Ninguém espera você atravessar a rua. Na verdade, essa é uma das maiores aventuras na cidade. As avenidas chegam a ter 4 ou 5 faixas até (pra cada lado), logo, é impossível esperar não ter carro algum pra atravessar. Então você vai atravessando faixa por faixa enquanto carros passam na sua frente e atrás de você. Eles vão todos buzinar, mas não tem o que fazer.

A rua é de todo mundo! 

- Maioria dos motoristas dirigem no lado direito. Ônibus é no lado esquerdo mesmo. Alguns carros mais novos também é no esquerdo, mas é raro. Porém, não é mão inglesa! É uma bagunça e não só por isso. Carros não respeitam outros carros. Ainda que se dê a seta, ninguém vai deixar o carro entrar. Se estiver vindo de uma rua menor pra entrar na avenida com trânsito, o carro na avenida chega a buzinar pra não deixar a pessoa entrar, mesmo que ela fique parada fechando a passagem. Logo, os motoristas são extremamente agressivos na direção, com muita buzina e um fechando o outro. Eu parei de prestar atenção pra não ficar mais desesperada!
- As pessoas encaram. Na Europa, a mistura de raças, nacionalidades, estilos, etc. é tão grande que ninguém se preocupa muito em te olhar duas vezes. E, se fazem, normalmente te ignoram logo em seguida. Com exceção de alguns alemães que adoram dar umas encaradas, mas são situações raras. Enfim, aqui eles te encaram sem escrúpulos, principalmente em locais com menos turistas. Crianças param até de brincar na rua para poder acenar pra gente! Em parques, algumas pessoas já até pediram pra tirar selfies com o Tim! Haha. Mas é importante dizer que eles não fazem por mal, é pura curiosidade. Geralmente eu encaro de volta e dou um sorriso, e recebo outro. Acho simpático.
- Tem lixo em todo lugar. Não há sistema de reciclagem, quase nunca vejo lixeira na cidade, mas lixo tem por toda parte: na rua, em terrenos, no rio. Ratos também. Barata, por incrível que pareça, não vi tantas, mas as que vi já estavam bem-criadas! Eu acredito que deve ser por causa da chuva.

Trânsito e pessoas caminhando na rua pela falta de calçada.

Quanto ao trabalho, é sensacional! Estou ajudando com relatórios, pedidos de financiamento e pesquisa para o projeto de erradicação do HIV/AIDS junto com outras organizações (inter)nacionais e ministério da saúde e do esporte de Myanmar. Trabalho principalmente com médicos discutindo políticas de saúde pública baseadas em dados recentes populacionais. É aquele momento orgulho em vir de um país com reconhecimento internacional na área (SUS) e de abrir horizontes pra novas opções de trabalho quando chegar o momento de voltar pra casa. É experiência muito além da profissional! Tô simplesmente amando! 😊

Bom, e ainda temos muito o que explorar. No final de semana que vem vamos pra Hpa-An. Assim que der, vou atualizando com mais detalhes da vida em Yangon, de outras cidades em Myanmar e mesmo alguns passeios pela Ásia.